sábado, maio 22, 2010

Eternos


tomar tuas mãos seria como
invadir obtusas estrelas
e vê-las como realmente são:
o quinhão emérito do infinito
que anelas, e a centelha escondida
entre as ruínas do que fomos.

arde no ar o fumo carburado
daquela viagem,
o negrume dos meus olhos ainda moços
com a tua verdura intransigente
e ouvem-se estridentes campanários
à passagem da caravana

nosso humor, colorido entre gozos e medos,
até que desandem as tardes para o que queiramos,
as direções delicadas de tudo o que hoje somos
inscrita na rosa aflatida das vontades.

tomar-te as asas e a sede
na noturna imprecisão dos sonhos
seria como o abandono natural
de estradas silenciosas
onde nossos passos semearam
pedras, galhos, insetos mínimos

e o ânimo da terra bebeu toda a tempestade -
a cidade transluzente dos teus dentes
e lábios mornos pronuncia uma vez mais
meu nome secreto

(e um certo invento rubro vai de novo
adornar-nos o peito úmido
afogar-nos o leito âmago
a imaginar-nos eternos).

24 comentários:

Sandra Bonadeus disse...

Lindo, lindo e muito lindo!!!

antes blog do que nunca! disse...

Um hino ao amor? Uma ode ao amor? Um cântico que nos induz à aproximação do que mais bonito há no mundo: o amor?

Tudo isso, querido Renato e ainda uma composição poética inspiradíssima e como tal: eterna.

Um beijo ao escritor e à musa!"
Luísa

nydia bonetti disse...

de fazer criar asas e tocar estrelas... tua poesia me comove, renato. abraço!

edson coelho disse...

"leito âmago" sentetiza o poema (teu) e a vida (nossa). diria mallarmé: exceto, talvez, uma constelação. não apenas o mar, também a terra, recebe com leitos cravejados de brilhantes. e o lúpulo, em algum bar de esquina. até lá!

Ana Flor disse...

Ô meu amor, lindo!
Obrigada pelo poema e pelo amor.
Te amo, tua flor.

Tere Tavares disse...

Feito marfim. Seria jasmim, seria assim o amor que assim é.
Perfeito.

Abraço

Renato Torres disse...

Sandra,

um prazer te receber na página branca! fazia tempo que não te via... obrigado por teu gostar!

beijo,

r

Renato Torres disse...

Senhora Lua,

a eternidade do amor, esta quimera acalentada como uma flor num planetinha exuperyano, é o tema desta composição. o amor devotado que nos acomete quando tal pessoa - a prometida - nos chega, inelutável. e é em meio às batalhas naturais da vida que vamos provando, dentro das fugacidades, a eternidade do amor, e as nossas próprias.

um beijo,

r

Renato Torres disse...

Nydia,

comover é um verbo a expressar um ponto de vista: o do coração. te agradeço a fina articulação, o verbete miraculoso.

beijo,

r

SKIZO disse...

In your honour and in the honour of wall the Writwrs and Poets, I published an ilustration.

Edmir disse...

Versos perfeitos. Na medida certa do que é "eterno".
Abraços,
Edmir
www.veropoema.net

Madalena Barranco disse...

E com essa imaginação, a realidade se veste de fantasia rubra e diz que é verdade... Que lindo, Renato!!
Beijos

Renato Torres disse...

Edson,

há mesmo essa metáfora especular, tão comum a nós, de cidade portuária, cortada de rios, onde a beleza de estrelas se reflete e se multiplica, unindo céus e terra. assim o amor, com sua energia de coalizão, a compor na conjugação dos arquétipos a arquitetura de nossas evoluções pessoais.

um grande abraço, irmão!

r

Renato Torres disse...

Flor,

decides o que deve ser essa quimera: uma bandeira de nuvens na manhã clara, ou a ferruginosa tarde avançando chuvosa e oblíqua no ventre da noite. onde quer que faças escolhas, lá estarei eu a te amar.

beijos fundos,

r

Renato Torres disse...

Tere,

a perfeição, mais que uma quimera, é mesmo como a primavera: precisa florescer sob auspícios e cuidadosos olhares. nem sempre conseguimos escutar o trote longínquo de sua armada florida, mas ela sempre há de irromper, e ressuscitar, num eterno ciclo de equanimidades.

beijo,

r

Anônimo disse...

Caríssimo Renato,

Rá rá rá. Tu és um portento!, me sinto um abécula (rápido, dicionário!) depois de ler teus escritos.
Olha, eu já sobrevivi aos "barroquistas", mas esta bazófia em forma de palavras é um verdadeiro mimo!
Mais hilário é este punhado de fanfarrões, inflando teu ego pra tu estourares lá no, quem sabe, "quinhão do emérito infinito".
É como disse J. Enar, este bêbado velho: pra ser entendido de pronto, seja ininteligível.
Faz o seguinte - simplifica isso aí. Dá muito trabalho "traduzir" o que escreves.
Tu fazes muitas voltas inúteis, mistura um monte de imagens estranhas. E, ao final, nem é nada demais.
Quer ver?, vê aí embaixo:

tomar tuas mãos seria como
invadir obtusas estrelas
(espero que não estejas chamando a menina de burra, caso contrário essa não fodes mais!)
e vê-las como realmente são:
o quinhão emérito do infinito
(que tal "pedaço distinto do céu", ainda é artificial, mas...)
que anelas, e a centelha escondida
entre as ruínas do que fomos.
(ou seja, a chama escondida da infância)

Resumindo, tu não pegas esta menina porque é muito burra, meio aluada e infantil.

Tá vendo, Renato... falaste, falaste e nada disseste. Toma jeito, menino!

Teu criado,


Evilásio Montenegro.

Renato Torres disse...

Evilásio,

cada um tem o direito de rir do que bem quiser, mas as tuas considerações, de todo galhofeiras, e também profundamente desrespeitosas - não só a mim, como a todos os que aqui comentaram - me trouxeram cá algumas reflexões.
em primeiro lugar, me parece equivocado que queiras, em ambiente poético, uma objetividade que, salvo revolução ainda ignorada por mim na história da literatura, vai de encontro àquelas propriedades inalienáveis da poesia, resguardadas no uso das metáforas. ora, te aconselho a leitura do livrinho "O que é poesia?", da coleção primeiros passos, de Fernando Paixão, que possuo, e li atentamente na minha adolescência. é licenciado a um poeta dizer as coisas de forma "indireta", e diria ainda, fazer as chamadas "voltas inúteis" (pra quê serve a poesia, e a arte, afinal? diria Wilde), e também, claro, "misturar imagens estranhas". se, ao final, o que escrevi não te parecer "nada demais", acho tranquilo; não tenho nenhum compromisso em ser "algo demais" pra quem quer que seja (se assim fosse, me focaria seriamente no ofício, e tentaria amealhar prêmios e publicações, e também, é claro, a melhoria de uma atividade de todo diletante e intuitiva). escrevo, mormente, por necessidade íntima; e compartilho, porque a arte precisa ser comunicada.
mas enfim, chegando na parte em que, realmente, me senti invadido e ofendido por tuas palavras, quero chamar delicadamente a tua atenção, fazendo o exercício jamais recomendado por Mário Quintana: o de explicar o que já é uma explicação:

ao dizer "tomar tuas mãos seria como
invadir obtusas estrelas / e vê-las como realmente são: / o quinhão emérito do infinito", estava a falar de uma visão obtusa, limitada, "burra"(eis a palavra que mais aprecias) que temos destes corpos celestes, vencida no ato de tomar as mãos da mulher amada. a "centelha escondida / entre as ruínas do que fomos", ainda que respeitosamente aceite a sua interpretação, associando uma distante infância perdida, em verdade estava a me referir a algo bem mais simples (ops! quem é mesmo complicado?): o amor que sempre resiste aos percalços e renascimentos inerentes a qualquer relacionamento. poderias ainda argumentar que é forçoso de minha parte dizer que "obtusas estrelas" refere-se a uma visão obtusa, já que a construção da frase associa o adjetivo "obtusa" ao substantivo "estrela"; mas te digo que, para além da licença poética, largamente franqueada a quem escreve, também creio que as coisas que vemos recebem de nós mesmos que as vemos as características e/ou qualidades que nós somos capazes de lhes atribuir, de acordo também com nossas características e/ou qualidades íntimas, intrínsecas, espirituais. se olhamos um céu de estrelas, e vemos apenas pontinhos luminosos, e não somos capazes de sentir ou imaginar nada mais profundo ou belo, tais estrelas nos serão "obtusas", mas os verdadeiros obtusos somos nós. talvez aí esteja a verdadeira dialética que pode fazer de nós poetas (ou bons leitores de poesia), ou não.

em tempo: Ana Flor, musa deste poema, e também um de seus comentadores, é minha companheira há quase cinco anos. não é, nem de longe, uma "menina muito burra, meio aluada e infantil" que eu tenha tentado "pegar" e não tenha conseguido, como julgaste, e tentaste fazer crer que o poema "revela". não recorri ao dicionário pra saber o que seja um portento, ou um abécula, meu caro interlocutor. mas, certamente, todos os que lerem o teu comentário perceberão que foste extremamente indelicado, mal educado, inconveniente e equivocado, pra dizer o mínimo.

passar bem,

r

Anônimo disse...

Afogueado Renato,

Sou um sauvage, um homem de péssimas maneiras e, dizem os mais chegados, um lunático que carece de cuidados daquele belíssimo edifício na rua Peixoto. O que eu quero dizer: não faça caso desse energúmeno que te escreve.
Escrevi tudo aquilo apenas pelo prazer da provocação. E percebi o gentleman dentro do homme de lettres. Em nenhum momento me achincalhou com impropérios, em nenhum momento foi deselegante (E olha, a julgar pelo números de palavras que escreveste, devo ter te deixado possesso!).
Mas, se ainda assim quiseres esganar meu pescoço, terás a oportunidade no Bocaiuva Bar, onde estarei apreciando Henry Burnett, Paulo Vieira e a banda Clepsidra. Não esqueça o livreto do Fernando Paixão.
A propósito, desculpe-me pelo que disse indiretamente a tua namorada. Não era minha intenção derramar sangue civil.

Au revoir,

Evilásio Montenegro

P.S.: Sobre poesia... ahh, poesia... teremos embates titânicos: a metralhadora contra o mosquete, o capoeirista contra o boxeur...

Renato Torres disse...

Evilásio,

não tenho a menor intenção de esganar teu pescoço - pelo menos não literalmente - e mesmo verbalmente, já fiz o suficiente na resposta já postada. tampouco te levarei livro algum, pois empresto livros apenas a amigos, coisa que certamente não somos. se quiseres te apresentar a mim no show de sábado, vá em frente. é possível receberes de mim um cumprimento e um sorriso cortês. mas não espere muito deste diálogo sobre poesia. primeiro, porque apenas te respondi pelo teor de desrespeito que considerei demasiado acintoso. segundo, porque não me interessa medir forças com quem quer que seja. me interessa, sim, continuar escrevendo, compondo, produzindo, o que farei, indiferente aos cães que ladram. a discussão, deixo-a aos que gostam de se ocupar dela, como parece ser seu caso.

r

em tempo: pseudônimo em literatura pode ser interessante... mas neste caso específico, e especialmente pela internet, me parece mais uma couraça pouco corajosa.

Renato Torres disse...

Skizo,

the greatest honour will always be part of something bigger, a brotherhood of artists that turn life into beauty.

hugs,

r

Renato Torres disse...

Edmir,

perfeição e eternidade, diria, sempre estarão no momento da leitura, da apreciação, talvez latente no objeto, mas muito mais fruto desta eclosão de belas vontades conjugadas. obrigado por vir ler!

abraços,

r

Renato Torres disse...

Madá,

sim, minha amiga: para além de qualquer artifício, ou do valor literário que venha a se agregar ao que ora escrevo, a verdade do que estou a dizer sempre estará resguardada. claro, nem sempre percebida, mas pulsará, íntima, no intento primeiro. que bom haver pessoas como você a perceber isso!

te agradeço,

beijo,

r

Anônimo disse...

Poeta Renato,
Negaste apertar a mão estendida que outrora te sangrava, ainda assim estava estendida. Desconsideraste uma flag branca hasteada no meu coração e pensamento. Deixaste-me feito um bedwuin. E nem posso reclamar, afinal de contas, eu procurei.
Touché, meu caro Renato, touché. Deixarei que seja tua a última estocada.
Abraço

Evilásio Montenegro

Sobre fakes e pseudônimos: Ora ora, o que é um nome para um total desconhecido? Pode ser Evilásio, Anglada ou Formento, tanto faz. Um nome é um nome, nada mais!

Renato Torres disse...

"somente lobos caem em armadihas de lobos"- leciona o evangelho de Jesus.
Desse modo, jamais te permitas o espinho da humilhação ou da desonra, quando agredido ou malsinado.
És o que vives interiormente e não aquilo de que te acusam.
Não te tornarás melhor porque estás elogiado, ou pior porque estás combatido.
Permanece, honrado e discreto, sendo tu mesmo, em busca do aprimoramento íntimo.

(Joanna De Ângelis)

Quem sou eu

Minha foto
Belém, Pará, Brazil
Renato Torres (Belém-Pa. 02/05/1972) - Cantor, compositor, poeta, instrumentista, arranjador, diretor e produtor musical. Formou diversas bandas, entre elas a Clepsidra. Já trabalhou com diversos artistas paraenses em palco e estúdio. Cria trilhas sonoras para teatro e cinema. Tem poemas publicados nas coletâneas Verbos Caninos (2006), Antologia Cromos vol. 1 (2008), revista Pitomba (2012), Antologia Poesia do Brasil vol. 15 e 17 (Grafite, 2012), Antologia Eco Poético (ICEN, 2014), O Amor no Terceiro Milênio (Anome Livros, 2015), Metacantos (Literacidade, 2016) e antologia Jaçanã: poética sobre as águas (Pará.grafo, 2019). Escreve o blog A Página Branca (http://apaginabranca.blogspot.com/). Em 2014 faz sua estreia em livro, Perifeérico (Verve, 2014), e em 2019 lança o álbum solo Vida é Sonho, autoproduzido no Guamundo Home Studio, seu estúdio caseiro de gravação e produção musical, onde passa a trabalhar com uma nova leva de artistas da cidade.